Jovem vocacionada Capuchinha conclui curso com TCC sobre as Co-Fundadoras da Congregação das IMC.Veja!

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Sou Gislaine Lopes, vocacionada Capuchinha, gggggggg

Trabalho final apresentado ao curso Tecnologia em Gestão de Turismo (IFCE). Apresentei este tcc em 21 de maio de 2013. Este artigo representa muito em minha vida, pois nasceu na vontade de me aprofundar na história e carisma das IMC, não foi apenas um trabalho final de faculdade, mas uma oportunidade de conhecer uma história tão rica e repassar as demais pessoas que ainda não conhecem. Segue meu telefone para eventuais dúvidas.(85) 9681- 3638(85) 8576- 0535

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CINCO GUERREIRAS CANINDEENSES EM UMA

HISTÓRIA PARA ALÉM DO BRASIL

Antonia Gislaine Bezerra Lopes[1]

Odilon Monteiro da Silva Neto[2]

RESUMO 

O trabalho irá apresentar uma história, que tem como protagonistas cinco jovens canindeenses, que dedicaram a vida ao trabalho de pastoral na terceira ordem franciscana da cidade de Canindé, município do Estado do Ceará há aproximadamente 114 quilômetros da capital. Partindo dos pressupostos da missão e da vocação no âmbito da religião, é que se constrói o fio narrativo sobre a gênese dessa exitosa experiência. Frei João Pedro em busca de freiras para educar os índios no Pará, enfrentou muitos desafios, visto que os índios da época não eram civilizados e poucos se sentiam bem com a presença de missionários no local, contudo a notícia do massacre que aconteceu no Maranhão, onde todos que estavam na missa às 5 horas da manhã foram massacrados pelos índios, foi se espalhando e as congregações femininas não aceitavam o convite de educar essas crianças, e as que aceitaram não compareceram. Ao perceber o interesse das jovens em dedicar seus dias ao trabalho com os mais pobres, Frei João Pedro, após muitos dias de retiro, convidou as jovens canindeenses para fundar uma congregação. Elas com simplicidade aceitaram o convite e migraram para o Estado do Pará para concretizar esse desafio, onde muitas irmãs preparadas não tiveram a coragem de partir para essa missão. Após cem anos de existência esta congregação vem se firmando nos territórios brasileiros com trabalhos dedicados ao funcionamento e manutenção de escolas, postos de saúde, práticas ligadas à saúde alternativa, como também fisioterapia.  Além de outras ações realizadas com os moradores de rua e recicladores. Além das fronteiras brasileiras as experiências estão presentes na África (Moçambique) e na América Latina (Equador).

Palavras-chaves: memória, missão e vocação.

ABSTRACT

The work will present a story that has as protagonists five young canindeenses who dedicated his life to pastoral work in third order Franciscan City Canindé municipality of the State of Ceará is about 114 kilometers from the capital. Based on the assumptions of the mission and vocation in the context of religion, is that it builds the narrative thread about the genesis of this successful experience. FreiJoão Pedro in search of nuns to educate Indians in Pará, faced many challenges since the time the Indians were not civilized and just felt comfortable with the presence of missionaries in place, however the news of the massacre that took place in Maranhão, where all who were at Mass at 5:00 am were massacred by the Indians, was spreading and women’s congregations did not accept the invitation to educate these children, and they agreed not to attend. Seeing the interest of young people to devote their days to work with the poorest, FreiJoão Pedro after many days of retreat, invited the young canindeenses to found a congregation. They simply accepted the invitation and migrated to the State of Pará to achieve this challenge, where many sisters prepared not had the courage to leave for this mission. After one hundred years of existence this congregation has established itself in the Brazilian territory with works dedicated to the operation and maintenance of schools, alternative health practices related to, but also therapy. In addition to other actions taken with the homeless and recyclers. Beyond Brazilian borders experiences are present in Africa (Mozambique) and Latin America (Ecuador).

Keywords: memory, mission and vocation.

 

1.                INTRODUÇÃO

 

A história das Irmãs Missionárias Capuchinhas tem sua origem nos antigos modelos missionários que o Catolicismo imprimiu no território brasileiro. O exercício da vida religiosa por aqueles que se dedicam ao sacramento da ordem, tem o sentido missionário, aliado ao universo da vocação. Etimologicamente a palavra missão vem do latim mission, ato de enviar, que remete a MITTERE, mandar, emitir. E vocação é de origem latina, vem de VOCATIO, voz que chama, chamamento.

Na história do cristianismo os dois termos num dado momento histórico passam a ser compreendidos como portadores de um mesmo significado. No antigo testamento, em várias passagens, a expressão missão é utilizada para designar a vontade de Deus na vida do povo judeu. Quando da tradução da bíblia do latim para o alemão, Martinho Lutero, traduziu a expressão missão, como vocação.

Nesse sentido residia aqui uma das bases do protestantismo, onde Deus dá a cada um uma vocação, e por sua vez como a vocação é destinada por Deus, se o individuo cresce em sua vocação é sinônimo que está atendendo a vontade divina. Essa visão de mundo que marca a chamada modernidade, entra em choque direto com a visão que a igreja católica defendia desde a Idade Média e constrói uma nova ética dos tempos modernos.

Pensadores que construíram a modernidade como Lutero rechaçaram a visão de mundo defendida por homens como São Francisco de Assis. Francisco se despe da riqueza, abre mão do que a vida lhe ofereceu e passa a ter uma vida mendicante. Vive de doações, acredita que essa seja a sua verdadeira missão. Já Lutero acredita que o cumprimento da missão reside no fato de o individuo crescer na sua vocação, algo que Deus o conferiu. Isso não seria pecado como a igreja defendia. Apenas o cumprimento da vontade de Deus.

Para que se possa compreender o sentido que as expressões missão e vocação foram se transformando ao longo do tempo, faz-se necessário que se compreende o modo pelo qual o protestantismo surgido na modernidade, configura esses conceitos. Vale ressaltar que as origens do movimento de Lutero estão dentro do cristianismo, espaço que o monge alemão fora formado. E que ambas visões de mundo tem como referência o judaísmo, que se enquadra dentre as religiões mais antigas do mundo.

Ao analisar a Ética Protestante e o Espirito do Capitalismo, o alemão Max Weber, analisa a concepção de vocação em Lutero:

 

 

O único modo de vida aceitável por Deus não era o superar a moralidade mundana pelo ascetismo monástico, mas unicamente o cumprimento das obrigações impostas ao individuo pela sua posição no mundo. Esta era sua vocação. Pensava em vocação algo estritamente individual e que dizia respeito a uma forma de atividade mundana(2000, p. 34).

 

 

Em oposição a essa visão um dos estudiosos da experiência missionaria em questão, o teólogo Frei Eldi descreve o que seria o verdadeiro sentido da missão para os indivíduos que dedicam suas vidas ao sacramento da ordem.

 

 

Antes de ser uma atividade, é contemplação e disposição para mergulhar no projeto e na bondade de Deus. O missionário não é protagonista da missão, só Deus o é. A iniciativa de Deus antecipa, acompanha e leva a bom termo a missão, onde antes de se entregar aos homens que quer evangelizar, o missionário se entrega a Deus de quem está enamorando.(2010, p. 34 e 36)

 

 

Vocação exige uma resposta individual, mesmo com a sua diversidade, nas quais são: humana, cristã, religiosa e matrimonial. Escolhe-se bem a vocação, quando se sente bem na mesma, contudo sabemos que o sentido etimológico da palavra vocação, se refere a chamado, um chamado divino, de Deus, para um trabalho coletivo, sendo a missão um envio para esse trabalho.O velho testamento da bíblia sagrada enfatiza que primeiro o “Senhor” chama, e após uma resposta ele envia. Fato presente, quando o Senhor envia seus discípulos, os profetas e os povos em missão.

De acordo com esses pensamentos, apresentaremos a história de cinco jovens que a partir de um chamado de Deus[3], aceitaram a missão concebida a elas, se tornando personagens de uma história centenária que teve inicio em 1904 e continua construindo essa história até os dias atuais.

Com a missão de catequizar as pessoas em especial os mais pobres, surge à congregação das irmãs missionárias capuchinhas, que inspiradas pelo exemplo de Francisco, nasceram, multiplicaram- se e hoje estão em missões para além do Brasil, com experiências na África (Moçambique) e na América Latina (Equador).

A missão é a razão de ser da congregação das Irmãs Missionárias Capuchinhas na igreja e no mundo. Assim diz irmã Utília Maria, quando relata o conceito de missão na obra “Um dom Missionário”.

No livro “o nosso leite e o nosso espelho”, Irmã Utília Maria afirma que a congregação das IMC, como Instituição Simbólica, é constituída por um grupo de pessoas com origens, pensamentos e particularidades diferentes que influenciam no convívio comunitário e foi no Ceará lócus de grandes figuras missionárias que ocorreu a gênese dessa experiência considerada como de grande êxito dentro e fora do país.

A cidade de Canindé foi centro principal da existência das irmãs missionárias capuchinhas (IMC), pois quatro das cinco fundadoras foram geradas e educadas em suas dependências, a quinta delas mesmo nascida emSanta Quitéria viveu e foi educada na cidade de Canindé, onde contribuiu por muito tempo, como terceira franciscana, catequizando os alunos do colégio, segundo, NEMBRO, (1975, pag.15 e 16).

Essa cidade é lembrada e vista como fundamentalpois as IMC, empreenderam  num ato de coragem e perseverança. Pois ao seguirem na ordem religiosa as cinco jovens tiveram que deixar a família, amigos e os bens materiais para irem à busca dos planos de Deus, a partir da pobreza, castidade e obediência.

Hoje com a presença do segundo maior santuário Franciscano da América Latina, a cidade de Canindé localizada a 114 km da Capital Fortaleza (IPECE, 2012), recebe um grande número de visitantes durante o ano, mas essa história centenária das Irmãs Missionárias Capuchinhas (IMC) não é conhecida pela população e visitantes, mesmo sendo uma congregação franciscana e tendo como protagonistas cinco jovens que viveram nesta cidade.

Contudo o objetivo central deste trabalho é revisitar e apresentar a comunidade canindeense esta história, mostrando a importância das Irmãs Missionárias Capuchinhas para a educação na cidade. Por elas foram educadas as meninas que perderam os pais, como também as que viviam em fazendas com a família, em boas condições, mas não tinham acesso a escola por falta de existência de instituições de educação para meninas na região.

Visto o empenho no desenvolvimento de crianças e o reflexo que essas irmãs deixaram a partir do trabalho realizado por dez anos nessa cidade, este estudo surgiu para apresentar aos canindeenses fatos históricos, visando à valorização de munícipes que construíram uma história plausível de dedicação aos que sofriam as desigualdades vivenciadas na sociedade.

 

2.                HISTÓRICO DAS IRMÃS MISSIONÁRIAS CAPUCHINHAS

 

Assim como ocorreu durante o período colonial, onde a igreja católica imprimiu grandes ações sobre o vasto território brasileiro, o norte do Brasil se configurou como área importante, já que dessa região podiam ser explorados uma grande quantidade de produtos que serviram para enriquecer a igreja através do poder paralelo desenvolvido pela Companhia de Jesus. Vale ressaltar que os Jesuítas chegaram a comandar companhias de comércio, no entanto os contatos étnicos sempre se configuram de modo beligerante.

 Assim descreveGraziella Merlatti foram enviados para catequizar os indígenas que não gozavam de boa fama entre os missionários, tanto que alguns padres, ainda em 1537, com toda seriedade lançavam dúvidas sobre a existência de uma alma humana nessas criaturas… ( 2001, p.20). Das várias experiências dos religiosos europeus e os povos nativos, esse foi o imaginário definido pela igreja, colocando os nativos como seres inferiores.

Na trajetória do espaço que seria ocupado pelas IMC estavam outras experiências começadas ao final do século XIX.  Ainda sob o discurso religioso de evangelizar as pessoas do Brasil, em especial os povos indígenas, uma segunda expedição composta por oito frades capuchinhos enfrentaram um cruzeiro turbulento, com embarque, aos 10 de novembro de 1894, saindo às 17 horas do porto de Gênova, com duração de quinze dias (RODRIGUES, 2004, pág. 19).

Passado algum tempo dessa missão, uma série de acontecimentos foram aproximando a experiência das IMC a um contexto diferente, indicando que sua ação seria para além do Ceará. Um desses episódios está narrado em seguida:

Às cinco horas da manhã de 13 de março de 1901, em Alto Alegre, região localizado na cidade de Barra do Corda- Maranhão, Padre Zacarias tinha iniciado a celebração da missa, quando os índios saíram precipitosamente dos seus esconderijos, armados de espingardas, arcos e flechas, foices, facas e bordunas[4]. Alguns se insinuam na capela pela porta aberta aos fiéis, outros cercam a casa das irmãs, a casa dos padres e aquelas dos moradores da vila (MERLATTI, 2001 p.60).

 

Um inesperado massacre organizado pelos índios locais sob a chefia de João Caboré apavora e mata os missionários, religiosos, religiosas e moradores que estavam rezando na capela com o intuito de realizarem a missão destinada a eles por ordem do superior dos capuchinhos, “sendo que apenas restou uma sobrevivente, pois teria se fingido de morta em meio aos corpos” (MERLATTI, 2001 p.59-60).

Após algum tempo, no Pará um colégio para meninas estava próximo a ser inaugurado em 23 de janeiro de 1905, com o nome de Instituto da Infância desvalida Santo Antônio do Prata. “No entanto as irmãs enviadas para essa missão foram massacradas”(NEMBRO, 1975, pag. 25)

Essa necessidade de educar as meninas surge quando os frades capuchinhos iniciam um trabalho com os meninos, contudo com os resultados positivos, percebe-se que as meninas da região não estavam se desenvolvendo, por falta de instrução. Então as Irmãs de Madre Rubato, recebem o convite de ensinar essas crianças. Foram enviadas antes da inauguração do colégio e se surpreenderam com o massacre no Maranhão.

Com a ocorrência do massacre, o medo tomou conta da cidade e tornou- se difícil encontrar religiosas para essa missão indígena de educar. Após várias tentativas, Frei João Pedro de Sexto, encontrou algumas religiosas da Congregação das Irmãs Franciscanas do Sagrado Coração de Jesus, que aceitaram a missão.

 No entanto próximo à data de início aos trabalhos, aconteceu um contratempo e as irmãs não compareceram ao local. Contudo cresceu a necessidade de conseguir irmãs que assumissem essa causa, no entanto agora com o prazo quase esgotado. Ansioso por um sinal de Deus, mas sempre com a convicção de que “DEUS proverá”, Frei João Pedro encontrou por meio dos frades capuchinhos de Canindé, cinco jovens Canindeenses, que “já eram conhecidas por seu engajamento na catequese paroquial e tinham um interesse de ingressar em um instituto franciscano, então aceitaram o convite de educar as meninas do Pará”(NEMBRO, 1975, pag.15 e 17).

Após muitos dias de oração, Frei Daniel sugeriu a Frei João Pedro que fundasse uma congregação com essas jovens, já que existia nelas o interesse de ingressar em uma congregação franciscana. Surgiram às dúvidas, e após vários retiros, Frei João Pedro decidiu convidar as jovens para fundar uma congregação que nasceu na missão e para a missão.

“Elas guiadas pelo espírito de Deus aceitaram o convite e partiram de Canindé ao Pará”, NEMBRO (1975, pag.19). Enfrentando dificuldades, ao viajarem de navio e em algumas partes do percurso de cavalo[5]. Chegam ao Pará em 14 de dezembro de 1904, e fundam a congregação das irmãs missionárias capuchinhas na capela de Nossa Senhora Auxiliadora em 18 de dezembro de 1904.

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Figura 1 – AS CINCO FUNDADORAS. FONTE: Memórias de Canindé (Online, 2013)

 

 Como mostra a figura 1, elas recebem o hábito e um nome para nova missão que acabam de se comprometerem, sendo as participantes fundamentais deste ato, as seguintes fundadoras: Francisca Barbosa Magalhães – Irmã Isabel Maria de Canindé; Maria de Nazaré Santos Lessa – Irmã Madalena Maria de Canindé; Cecília de Paula Pimenta – Irmã Verônica Maria de Canindé; Ana Xavier Macambira – Irmã Clara Maria de Canindé; Maria Barbosa Cordeiro – Irmã Inês Maria de Santa Quitéria.

Naquele dia 04 de dezembro de 1904, dia da celebração de fundação, iniciou uma nova etapa na vida dessas irmãs, que a partir de então viveram na simplicidade, sempre lembrando e transmitindo para as novas gerações as palavras do fundador Frei João Pedro de Sexto São João ao enviá-las em missão, foram:“Ide com coragem, alegria e misericórdia, filhas, de vós esperamos grandes coisas”[6].

 

 

2.1           Irmãs Missionárias Capuchinhas em Canindé

Ao responderem ao chamado de Deus, as componentes da nova congregação, cumprem com amor a missão enviada a elas. Enquanto isso em Canindé surge em 1907, um orfanato para meninas, como mostra na figura 2, alguns cômodos,“sendo que os meninos já estavam bem instruídos”. Segundo entrevistas informais com um pesquisador da história dos sertões de Canindé, Sr. Júlio Cézar (Alemão), esta nova instituição, de início foi de responsabilidade de leigos como Dona Joaquina Pimenta e Dona Raimunda, que administraram muito bem as crianças, a maioria de famílias humildes.

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Figura2 – CÔMODOS DO ORFANATO.FONTE: Memórias de Canindé (Online 2013)

Contudo em uma visita do bispo Dom Manuel da Silva Gomes a cidade no ano de 1913, fica claro a necessidade de religiosas na educação daquelas meninas, já que o orfanato visava de modo especial àinstrução religiosa de cada uma.

Com o trabalho existente no colégio do Prata no Pará, o bispo indica as capuchinhas da ordem terceira para dirigirem esse orfanato. Com prazer seu superior Regular, Frei João Pedro envia a Canindé, aos 27 de fevereiro de 1913, as seguintes religiosas: Irmã Escolástica de Redenção como superiora, Irmã Águeda de São José e Irmã Margarida Conversa, como auxiliares. “Foram acolhidas com uma grande festa de recepção, logo em seguida começaram os trabalhos designados a elas”.(RODRIGUES, 2004, pag. 45).

Durante dez anos as irmãs cuidaram com muito esmero do orfanato, recepcionando e hospedando com simplicidade, zelo e alegria as meninas. O número de crianças variava entre vinte ou sessenta a cada ano, visto que viviam da caridade dos romeiros de São Francisco das Chagas de Canindé, a maioria eram crianças humildes e não traziam consigo o necessário para uso pessoal.

Mesmo em ambiente disciplinar as crianças eram amadas pelas irmãs.  O espaço recebeu por diversas vezes a visita do bispo do Ceará, Dom Manuel, que fora recepcionado com muita alegria, flores e apresentações. Viviam na simplicidade, com muita disciplina, quanto aos horários e educação, mas principalmente viviam em busca de Deus, pois eram instruídas a viver o evangelho.

Durante muitos anos as irmãs foram acompanhadas pelos frades capuchinhos, tendo sua independência a partir de 1924, “contudo em 25 de março de 1923 os frades capuchinhos deixaram Canindé, então as irmãs tambémdeixaram o orfanato” (RODRIGUES, 2004, pag. 45).

Escritos do livro de tombo do educandário Santa Clara no período de 1913 a 1923, relata que esse foi um período cheio de sombras, devido à primeira guerra mundial, a crise financeira e a carência de pessoal, e os frades não poderem sair da Itália, em tempo de guerra. A missão passou por momentos difíceis e talvez por isso, Frei Alfredo não abriu nenhuma casa para as irmãs, não permitiu entrada de novas candidatas, chegou a fechar o noviciado, no dia 12 de agosto de 1916, e nenhuma irmã pode fazer votos perpétuos, nem mesmo as co-fundadoras. Foi tempo de experiência de cruz-sofrimento e talvez medo. (Livro de Tombo 1913 a 1923)

Em entrevista informal com o Sr. Júlio César (Alemão), memorialista local, informouque com a despedida das irmãs em 19 de janeiro de 1924, assumem essa missão agora com o nome de Educandário Santa Clara, as irmãs Missionárias da Imaculada Conceição. Para chefiar os trabalhos estiveram à frente as religiosas:Madre Clara Eller, Irmã Paula, Irmã Agostinha e Irmã Gabriela.

O Educandário Santa Clara fechou suas portas em 1975, pois já haviam muitos colégios em Canindé, então não havia mais necessidade de continuar os trabalhos. Para atender ao pedido dos frades residentes em Canindé, as Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição cederam o espaço do Educandário para o Hospital Regional São Francisco, visto que era a maior necessidade para a população. “relatos de irmãs que ensinaram neste educandário, após 1923.”

Ainda hoje o educandário tem grandes reflexos para a cidade de Canindé, visto que após ser desativado, o prédio foi reformado e transformado no hospital Regional São Francisco, que como mostra a figura 3, viveu de esmolas para atender a população, sendo que hoje se mantem com recursos públicos e privados.Atende a população canindeense e cidades circunvizinhas, contando com uma equipe médica preparada para receber munícipes e visitantes que vem nas romarias em devoção ao São Francisco De Assis.

Figura 3- NOTÍCIA SOBRE O HOSPITAL DO MUNICPIO DE CANINDÉ. FONTE: Pesquisador Júlio César (Alemão)

No outro lado do prédio funciona o curso profissionalizante Santa Clara que ajuda diversas famílias sendo uma forma de contribuir financeiramente, pois no curso as pessoas aprendem a fazer trabalhos manuais que se bem aproveitados, pode ser uma forma de ocupar o tempo de diversas jovens e ainda ajudar na independência financeira de domésticas.

A comunidade canindeense tem muito a agradecer as irmãs missionárias capuchinhas, pelo trabalho realizado nesses 10 anos (1913 a 1923), e as Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição pelos trabalhos seguintes. As irmãs foram de extrema importância na educação da população de Canindé, partindo do pressuposto que foi o primeiro contato dessas crianças com o conhecimento. As meninas foram educadas com rigor, tendo a oportunidade de crescer diante dos desafios que a vida lhes oferecia.

Foram momentos de sofrimento e vitórias, se passaram 100 anos e as irmãs continuam vivendo o projeto inicial, superando as dificuldades e alcançando objetivos, muitas alunas se tornaram freiras, outras casaram, no entanto aprenderam os princípios religiosos e as disciplinas didáticas, mas aprenderam principalmente a viver com as desigualdades que a sociedade oferece.

 

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2.2    IRMÃS MISSIONÁRIAS CAPUCHINHAS NA ATUALIDADE.

 

Após 108 anos a congregação das Irmãs Missionárias Capuchinhas vivenciam o projeto inicial, resgatando o sonho de famílias a partir de ações realizadas com catadores de lixo, recicladores, moradores de rua e abrigo de idosos. Apoiando essas pessoas, muitos conseguem sair da extrema pobreza através de reciclagem.

Quanto aos moradores de rua, são realizadas campanhas para doações de roupas, remédios e produtos de higiene pessoal em períodos festivos como o natal, e muitos se alimentam diariamente nas residências das irmãs. 

Na cidade de Maranguape, aqui noCeará, Irmã Socorro Soares em entrevista informal afirma que as IMC cuidam de um abrigo, onde estão hospedados 110 idosos que diariamente se alimentam bem e recebem cuidados necessários para uma boa vivência. Com profissionais da saúde que frequentemente atendem esse público, além de profissionais que cuidam da higiene pessoal, alimentação e limpeza do espaço.

Seguindo com o carisma: “Encarnar o franciscanismo no discipulado de Jesus Cristo e seu projeto missionário, servindo preferencialmente os mais pobres com coragem, alegria e misericórdia” (RODRIGUES, 2004, pag.299) O trabalho se estende na educação, saúde e em missões além-fronteiras.

Os capuchinhos italianos foram fiéis à missão no sertão[7]. Frei João Pedro era integrante desta ordem de religiosos franciscanos que em missão comiam o que os pobres doavam e andava a pé. Tendo em vista que fundou a congregação das irmãs missionárias capuchinhas e assumia o papel de superior regular, as irmãs também precisavam colocar-se em ação na busca dos mais necessitados através de visitas realizadas com fervor na simplicidade, caminhando ao encontro da pobreza.

Segundo LuisMosconi, “a situação sócio- político e econômica do mundo, revelam desigualdades, injustiças, corrupções, abusos, violências de todo tipo” (MOSCONI, 2012, p.24).Contudoo trabalho realizado pelas irmãs missionárias capuchinhas com os menos favorecidos da sociedade aliviam as situações citadas.

Atualmente em relação ao território brasileiro a congregação está presente na Amazonas e Pará distribuídas em 8 casas, no nordeste estão presentes com 28 casasno Maranhão, Piauí, Ceará, Paraíba e Pernambuco. Na região Sudeste são 4 fraternidades. Na região centro oeste estão em cinco fraternidades. (Fonte:Associação das Irmãs Missionárias Capuchinhas- online, 2013)

Em todas as casas conhecidas como fraternidades, o número de irmãs varia de acordo com a necessidade do local, algumas delas são casas de formação onde acontecem as formações de novas vocações (vocacionadas), que são acompanhadas em casa no meio familiar e se deslocam mensalmente até a casa de formação em busca de discernimento. Na continuidade da formação as jovens ingressam na congregação para uma experiência, até a realização dos votos perpétuos, as jovens passam por quatro etapas de formação (aspirantado, postulado, noviciado, juniorato). Nessas etapas as jovens moram nas fraternidades, ajudando nas comunidades.

 

 

3.                METODOLOGIA E ANALISE DOS RESULTADOS

 

Para a realização deste trabalho, foram utilizados três caminhos metodológicos: Levantamento bibliográfico, pesquisa documental e entrevistas orais.  No levantamento bibliográfico, foram analisadas diferentes obras. Um primeiro grupo de estudos tem o objeto da investigação como temática. Aqui reside os estudos com grande marca memorialista, produzida pelo grupo das irmãs capuchinhas. Outras obras tem como foco de suas analises diferentes momentos da história da igreja e de suas práticas de atuação.

Quanto à pesquisa documental, foram utilizados os arquivos da Porciúncula (casa mãe das irmãs missionárias capuchinhas), e o livro de tombo do Educandário Santa Clara em Canindé. Esses registros são o que os estudiosos chamam fontes primárias, documentos no estado em que foram produzidos. Tem grande relevância para a pesquisa qualitativa, pois podem oferecer elementos a serem confrontados com outras fontes e indícios a serem percorridos durante a execução do trabalho.

O terceiro caminho orientou-se através da história oral. Metodologia bastante empregada no universo das ciências sociais e humana. Nesse sentido as entrevistas foram construídas tendo a história oral temática e a história de vida das entrevistadas, como referência. Já que o grupo de entrevistados foi composto pelas irmãs missionárias capuchinhas, irmãs missionárias da imaculada conceição e pessoas da comunidade sendo uma delas ex-aluna do educandário santa clara.

 

3.1    RESULTADOS

 

Foram entrevistadas irmãs missionárias capuchinhas e irmãs missionárias da imaculada conceição, cujos resultados são apresentados a seguir:

Segundo Irmã Celeste (SMIC), aluna do Educandário de 1960 à 1963, as vocações atuais devem ter diminuído devido à falta de instrução religiosa nas escolas hoje, contudo foi um fator importante na vocação de meninas que ao verem o empenho das irmãs, perceberam o chamado de Deus para a missão religiosa.

Afirmou ainda que as crianças ajudavam na organização das salas e se dedicavam aos trabalhos manuais, sendo instruídas no ensino básico, espiritual, social e boas maneiras.

Segundo Irmã Guadalupe (SMIC), (Coordenadora do Curso Profissionalizante Santa Clara), o Educandário Santa Clara funcionou até 1975, afirmou que na verdade era Internato, pois a maioria das meninas tinham pais e pagavam mensalidade.

Irmã Hugulina (IMC), que conviveu com três das irmãs fundadoras, afirma que eram pessoas caridosas, que se preocupavam com os mais pobres e se empenhavam para conviver bem com as irmãs da congregação.

Na Porciúncula das Irmãs Missionárias Capuchinhas, encontrei o livro de tombo do educandário dentre os anos de 1913 e 1923, tempo em que assumiram a direção da escola. O mesmo relata o dia a dia das irmãs, as vezes que o bispo se fez presente, o dia a dia das meninas e os motivos da saída do educandário.

Para materializar este artigo, visitei a Porciúncula[8] em Messejana, bairro da capital Fortaleza (casa mãe), das IMC, e em entrevistas informais, relataram com prazer as histórias da congregação, Os momentos de alegria aos momentos de tristeza como a morte do fundador. Se expressam com empolgação sobre o percurso das cinco jovens na viagem de Canindé ao Pará.

Visitamos a secretaria de educação de Canindé, em busca dos documentos do educandário Santa Clara, no entanto as pessoas que trabalhavam no local, nem mesmo conhecia essa história. Continuando as buscas resolvemos procurar as irmãs da Imaculada Conceição, visto que foram as últimas a cuidarem do internato, contudo responderam que não existem notícias desses documentos e informaram que foram retirados todos os materiais do prédio.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Com o aprofundamento da pesquisa observou-se através de entrevistas com alunas do educandário Santa Clara, que não se tratava apenas de orfanato e sim internato e externato, pois ali também se encontravam filhas de fazendeiros, visto que esse foi o primeiro colégio para meninas de Canindé.

 Em seguida veio surgir outras escolas, anos depois da inauguração do internato. Tendo em vista essa informação, mesmo após o surgimento de outras instituições de ensino, o educandário era o mais preparado e procurado pelos pais, pois as irmãs que ali se dedicavam eram rigorosas, sendo educação e religião os principais objetivos a serem conquistados com todas as alunas, sem distinção entre as meninas órfãs que não pagavam mensalidades, as meninas advindas de fazendas e as bolsistas com pais vivos, mas sem condições de pagar uma formação inicial para as filhas.

Considerando o tempo de existência do educandário, apresento a dificuldade em localizar os documentos, pois não há notícias sobre o lugar que levaram o material da escola e os órgãos públicos desconhecem essa história, contudo não sabem do paradeiro desses papéis.

Para maiores resultados serão necessários novas pesquisas, no entanto os resultados encontrados para este artigo foram essenciais para revisitar a história e considerar ações que possam concretizar os objetivos do presente trabalho. Algumas ações podem ser sugeridas e realizadas no município de Canindé.

Dentre elas podemos destacar: A presença das Irmãs Missionárias Capuchinhas no território canindeense, para apresentar os trabalhos sociais já realizados, através de palestras ou ações concretas com o apoio dos munícipes de Canindé; Incluir nas escolas, o conhecimento das histórias da cidade onde convivem em meio social, politico e familiar. Visto a importância de valorizar as inúmeras escolas que o município oferece e a história a qual fazem parte; e a capacitação com os professores, para estarem preparados a apresentar o passado aos alunos do presente.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

CASTILHO, Utília Rodrigues. IMC, Buscar na fonte, Frei João Pedro de Sexto, São João. São Luiz: Christus, 1994.

__________. O nosso leite e o nosso espelho, Frei João Pedro de Sexto. São Luiz ed. Christus, 1997.

__________.  Um dom missionário. São Luiz: Christus, 2000.

___________. Uma história de amor (feita de luzes e sombras) 1904-2004. Fortaleza:Christus, 2004.

COLÉGIO SANTA CLARA. Livro de Tombo: 1913-1923. Canindé-Ceará.

ELDI, Frei. Espiritualidade Missionária do carisma de Frei João Pedro de Sexto São João: ed. LCR, São Luiz, 2010.

MASCONI, Luiz, A vida é missão, para uma missiologia mística popular.Belém[PA]: Marques Editora, 2012.

MERLATTI, Graziella. Amor e martírio em Alto Alegre-1901-2001. Maranhão: Editora Ética, 2001.

NEMBRO, Frei Metódio de. Frei João Pedro Missionário Capuchinho– superior e fundador. Vol.01.  Petrópolis [Rio de Janeiro]: Vozes, 1974.

________. Frei João Pedro Missionário Capuchinho– superior e fundador. Vol. 02. Petrópolis [Rio de Janeiro]: Vozes,­­1975

HOORNAERT, Eduardo. O cristianismo moreno no Brasil. Petropólis [Rio de Janeiro]: Vozes, 1990.

IRMÃS MISSIONÁRIAS. In: http://www.irmasmissionariascapuchinhas.org/site/. Acesso em 30 de março de 2013.

IPECE. Disponível em <http://www.ipece.ce.gov.br/publicacoes/perfil_basico/pbm-2012/Caninde.pdf>. Acesso em: 10 de janeiro de 2013.

FRANCISCO.PAULA:http://www.francisco.paula.nom.br/Armas%20Brasil/Indio/bordunas.htm. Acesso em 01 de maio de 2013. As 15:00h.

MEMÓRIAS DE CANINDÉ:http://memoriasdecaninde.blogspot.com.br/. Acesso em 15 de janeiro de 2013.

ORDEM DOS FRADES MENORES CAPUCHINHOS: In: www.capuchinhos.org. Acesso em 31 de março de 2013.

SIGNIFICADO. Disponível em: http://www.significado.origemdemissa. Acesso em 26 de janeiro de 2013

TURMA DA BARRA. Disponível em: http://www.turmadabarra.com, acesso em 22 de fevereiro de 2013.

WEBER, Max. A ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

 


[1] Graduanda em Tecnologia de Gestão em Turismo – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará – IFCE – Campus Canindé. gislainelopesif@gmail.com

[2] Licenciado em História pela Uece. Especialista em Perspectivas e Abordagens em História pela Uece. Professor de História do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará IFCE – campus Canindé, odilonmonteiro@ifce.edu.br

[3] Esse é o sentimento do sacramento religioso da ordem.  Os homens, ou seja, homens e mulheres que se sentem vocacionados ao cumprimento desse sacramento, optam em não seguir o matrimônio e deixam a vida comum para seguirem os desígniosde Deus. Essa e uma visão religiosa, que na experiência em estudo ocupa o sentido principal.

[4]Parte importante da cultura bélica indígena, a borduna não era uma ferramenta de uso diário como o arco e flecha, se destinando unicamente para a guerra. A borduna nada mais era do que uma clava – um pau pesado em uma extremidade, que causava danos pelo impacto direto. As formas dessa arma (comprimento, peso, forma, decoração, etc) – e até os nomes (borduna, manacã, tangapema, ivirapema, tacape, etc), variam de grupo indígena para grupo indígena.(francisco.paula – online, 2013)

[5] No começo de dezembro de 1904, Frei João Pedro escreveu a Frei Matias para que pensasse na viagem das candidatas. Elas embarcaram em Fortaleza em número de 4, no dia 10 de dezembro, sendo ajudadas nas práticas necessárias por Frei Mansueto de Peveranza, e chegaram a Belém no dia 14, uma quarta-feira, de manhã cedo. Frei João Pedro esteve presente no desembarque, junto com outros missionários ajudando nas relativas práticas; a seguir, providenciou o seu transporte até o Retiro Saudoso, por meio de um “cabriolé”, que era uma espécie de carruagem de duas rodas, puxada por um cavalo. (NEMBRO, volume 2, p.20)

[6] Fala da Irmã Dulcis Negrão Rodrigues, durante o Encontro Vocacional da Congregação ocorrido em Julho de 2012 em Messejana, Fortaleza-Ceará.

[7] Eduardo Hoornaert afirma que poucos religiosos tiveram a coragem de enfrentar o sertão no que se tinha de perigoso por suas doenças, povos indígenas e animais, febres e mil incômodos. O século 19 foi o século por excelência das Santas Missões no sertão. Três grupos agiram nesse campo, mas aos poucos abandonaram- o para dedicar-se nos seminários. Um desses grupos: capuchinhos italianos se identificaram bastante com o povo sertanejo, pois se acostumaram a andar a pé e não viajar carregados na rede por escravos como faziam os missionários comumente. Cavavam o chão com a enxada nos mutirões, carregavam pedras com o povo nas construções comunitárias e viviam muito pobremente. (HOORNAERT, 1990)

[8] É o nome conhecido da pequenina capela, no vale de Assis, onde São Francisco iniciou o seu encontro com a Palavra e aí concluiu o seu itinerário, descobrindo as maravilhas de Deus e da criação. «Porciúncula» é o nome de um espaço, na Internet, de estudo, reflexão e oração individual ou em grupo, a partir da Bíblia. In:http://www.capuchinhos.org/siteantigo/porciuncula/principal.htm. Acesso em 31 de março de 2013.